quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Os tempos de Rubem Alves

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Mas há outro tipo de escritura que não tem prazo de validade. Nenhuma data informa a sua idade porque a sua idade não importa: ela nunca fica velha.

Quem entende isso são os poetas e os místicos. Poesia não tem data, está sempre jovem, não envelhece com a passagem do tempo -porque ela nasce de um outro tempo. O místico Ângelus Silésius explicou assim: "Temos dois olhos. Com um, vemos as coisas eternas, que permanecem. Com o outro, as coisas efêmeras, que desaparecem". Então, há dois tempos, um tempo das coisas que não passam e, portanto, não têm prazo de validade, e um tempo das coisas que valem só por um dia e logo desaparecem...

Aquilo que o tempo comeu, o tempo trará de volta. Como diz absurdamente o livro do Eclesiastes: "Lança o teu pão sobre as águas porque depois de muitos dias o encontrarás...". Pão sobre as águas do rio. As águas do rio passam e dissolvem o pão. As águas voltam -porque o rio é circular- e com elas volta também o pão. Tudo se repete. Não leio de novo o jornal de ontem. Ele está morto. Mas leio de novo, muitas vezes, o poema que já li, e sempre que o faço a vida ressuscita.
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